Durante a cúpula do East Asia Summit 2025 realizada em Kuala Lumpur, o primeiro-ministro da Malásia, Anwar Ibrahim, proferiu um discurso com forte apelo ao multilateralismo e à cooperação regional, instando os países da Ásia-Pacífico a escolherem “diálogo sobre coerção e cooperação sobre confrontação”.
Esse posicionamento ocorre em um momento de crescente tensão geopolítica e econômica na região — em especial na disputa no Mar do Sul da China, no contexto entre as potências China e Estados Unidos, e em meio a crises internas como a de Myanmar.
Contexto geopolítico
A região sudeste asiática e o Indo-Pacífico mais amplo enfrentam diversos desafios simultâneos:
- A disputa pelo Mar do Sul da China é um dos focos centrais. Anwar destacou que essa disputa deve ser resolvida mediante o Código de Conduta (Code of Conduct) negociado pela ASEAN e parceiros, e advertiu que a pressão externa pode escalar tensões.
- A rivalidade entre grandes potências (China × EUA) traz repercussões diretas para os países menores da região, que precisam administrar suas relações com ambas sem perder autonomia.
- Crises internas na região, como em Myanmar, e lançamentos de mísseis pela Coreia do Norte, ampliam a agenda de segurança da ASEAN além da mera disputa marítima.
- Além disso, há forte pressão econômica: tarifas, cadeias de suprimentos globais, e a necessidade de integração econômica regional para aumentar resiliência.
Principais mensagens do discurso
Diálogo versus coerção
“Continuamos a advogar pelo diálogo em vez da coerção… e pela cooperação em vez da confrontação. Confirmamos nosso posicionamento em favor da paz e da segurança globais, pelo multilateralismo e pelo direito internacional.”
Anwar enfatizou que a coerção — seja por forças externas ou internas — não deve substituir a diplomacia e o entendimento entre os países da região.
Multilateralismo e direito internacional
Ao colocar o direito internacional e o multilateralismo no centro, Anwar busca reafirmar que as disputas — como a do Mar do Sul da China — devem se dar dentro de códigos e normas, não apenas pelo poder bruto.
A autonomia da ASEAN
O discurso sugere que a ASEAN não deve ser passiva nem dominada pelas agendas das potências externas. Anwar afirmou que disputas como a marítima devem ser resolvidas pelo bloco e pelos parceiros, reforçando a agência regional.
Integração econômica e resiliência
Ele também destacou que a integração econômica da ASEAN — por meio de acordos internos ou parceria com potências externas — é vital para enfrentar choques globais e manter a prosperidade.
Cenário de crises externas
O discurso tocou em temas como as guerras em Gaza e Ucrânia, a crise de Myanmar, e o aumento de atividades militares da Coreia do Norte — evidenciando que a ASEAN não está isolada da ordem mundial.
Implicações para a região e para os países-membros
- A retórica fortalece o papel da ASEAN como ator relevante, não apenas como arena de disputas entre grandes potências.
- Pode ajudar a reforçar a coesão interna entre os países-membros, que enfrentam pressões externas e diferentes níveis de desenvolvimento.
- Oferece um formato de “entrelaçamento” diplomático onde os membros não precisam escolher entre China ou EUA, mas podem maximizar benefícios e minimizar riscos.
- Contudo, a efetividade do discurso dependerá da capacidade de transformar declarações em ações concretas — por exemplo, avanço no Código de Conduta no Mar do Sul da China, ou progressos reais no caso de Myanmar.
Desafios e riscos
- A resolução das disputas no Mar do Sul da China permanece complexa: a China detém presença robusta e alguns Estados reclamantes estão frustrados com a lentidão das negociações.
- A crise de Myanmar continua sendo um grande problema para a ASEAN — faltam resultados claros e há limitação de poder real sobre a junta militar.
- A integração econômica desejada enfrenta obstáculos como infraestrutura, disparidades de desenvolvimento entre membros e competição global crescente.
- A ASEAN ainda depende em larga medida de potências externas, o que coloca em risco sua autonomia se não equilibrar bem as relações.
Conclusão
O discurso de Anwar Ibrahim representa um momento significativo para a ASEAN: ele marca uma reafirmação da vontade de cooperação, da centralidade das normas internacionais e da busca por autonomia regional. Para jornalistas, analistas de geopolítica e interessados em política externa, essa fala representa mais do que um símbolo — é um indicativo de como a região pretende navegar em um mundo de tensões crescentes.
Se essa retórica se transformar em prática, estaremos vendo a ASEAN evoluir de fórum regional para ator estratégico de fato no Indo-Pacífico.

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