Avanço Militar de Israel em Quneitra, Síria: Escalada Regional e Impactos no Equilíbrio de Forças

Dois oficiais militares, um israelense e um americano, observam monitores em uma sala de comando durante um briefing estratégico.
Oficial do Exército de Israel explica sistemas de monitoramento ao Major General Larry Shellito da Guarda Nacional dos EUA, em 2008, ilustrando a coordenação estratégica em operações militares.

A tensão no sul da Síria atingiu novos patamares em 2025, com a intensificação do avanço militar israelense na província de Quneitra. Desde o colapso do regime de Bashar al-Assad, em dezembro de 2024, após uma ofensiva islamista que fragmentou o controle do país, a região se transformou em palco de movimentações estratégicas que desafiam acordos históricos e ameaçam reconfigurar a geopolítica do Oriente Médio.

Historicamente parte de uma zona desmilitarizada estabelecida pelo Acordo de Separação de Forças de 1974, Quneitra sempre ocupou posição sensível na fronteira entre Israel e Síria. No entanto, a recente ausência de um governo central forte em Damasco abriu espaço para operações israelenses cada vez mais ousadas, justificadas por Tel Aviv como medidas de segurança para impedir a presença de grupos armados como Hezbollah e milícias apoiadas pelo Irã.

Linha do tempo da escalada

O primeiro avanço ocorreu logo após a queda de Assad, em dezembro de 2024, quando tropas israelenses cruzaram a linha de cessar-fogo e assumiram posições na zona-tampão. Em fevereiro de 2025, o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu declarou publicamente que não permitiria a presença do grupo jihadista Hayat Tahrir al-Sham (HTS) nas províncias de Quneitra, Daraa e Suwayda, e defendeu uma presença militar indefinida para proteger comunidades drusas.

A partir daí, as operações se tornaram mais frequentes e robustas. Em 5 de março, houve três incursões em apenas 24 horas, atingindo localidades como Ain al-Nurieh, Umm Batna e Swissa. Menos de duas semanas depois, em 19 de março, Israel lançou sua maior operação até então na região, mobilizando cerca de 50 veículos blindados para avançar sobre a cidade de Al-Adnaniyah.

No mês de julho, a ofensiva se expandiu para Suwesah e Nabaa Al-Sakhr, onde pelo menos seis civis, incluindo duas crianças, foram detidos. No mesmo período, Israel foi acusado de incendiar deliberadamente terras agrícolas em Al-Rafid, destruindo dezenas de dunams e interditando aproximadamente 6 mil hectares para uso militar.

O episódio mais recente ocorreu em 9 de agosto de 2025, quando comboios israelenses avançaram sobre Ruwayhina, Rasm al-Halabi e Al-Rafid, estabelecendo pontos de controle e recuando horas depois, mas mantendo vigilância constante sobre a área.

Impactos humanitários e sociais

O avanço israelense provocou perdas significativas para a população local. Casas foram demolidas, plantações destruídas e o movimento de civis severamente restringido por bloqueios militares. Agricultores relatam a perda de olivais e campos inteiros, o que comprometeu a segurança alimentar e a economia rural. Muitas famílias foram obrigadas a deixar suas casas, deslocando-se para outras regiões da Síria.

Repercussão internacional

As ações de Israel em Quneitra receberam condenação da ONU e de diversos governos estrangeiros, que consideram o avanço uma violação direta do acordo de 1974 e da soberania síria. Em 10 de agosto de 2025, o Ministério das Relações Exteriores de Singapura classificou como “perigoso e inaceitável” o plano israelense de expandir operações militares em Gaza, conectando o alerta ao aumento da tensão em outros pontos de conflito na região.

Apesar das críticas, não há sanções internacionais específicas contra Israel pelo caso de Quneitra, e as respostas diplomáticas têm sido limitadas a declarações formais.

Consequências estratégicas e equilíbrio de forças

A presença militar israelense em Quneitra oferece a Tel Aviv controle sobre posições estratégicas, como observatórios no Monte Hermon e colinas que dominam vias de acesso militares. Essa vantagem permite monitorar movimentações sírias e de aliados como Hezbollah, dificultando a consolidação de rotas logísticas do Irã entre Damasco e o sul do Líbano.

Para o Hezbollah, a nova configuração impõe desafios operacionais e logísticos, mas também pode servir de incentivo para intensificar ações de desgaste na fronteira libanesa. Já para o Irã, a perda de acesso fácil ao corredor sírio representa um revés estratégico que pode motivar ajustes em sua presença e apoio militar na região. A própria Síria, enfraquecida politicamente, vê sua integridade territorial comprometida e sua capacidade de resistência cada vez mais limitada.

Perspectivas

Se Israel mantiver a ocupação e ampliar infraestruturas militares em Quneitra, o equilíbrio de forças no sul da Síria tende a sofrer mudanças permanentes. O prolongamento desse cenário aumenta o risco de confrontos diretos com o Hezbollah, de respostas indiretas do Irã e de agravamento da crise humanitária local. A fronteira sul síria, que por décadas foi relativamente estável, pode se tornar um dos epicentros de tensão no Oriente Médio nos próximos meses.

Conclusão

O avanço militar israelense em Quneitra representa mais do que uma operação pontual: é parte de uma estratégia de longo prazo para redesenhar a configuração de segurança no sul da Síria. Essa movimentação altera o equilíbrio de forças na região, ameaça acordos históricos e impõe custos humanitários significativos à população local. A permanência dessa presença militar, combinada à ausência de uma solução diplomática concreta, cria um cenário volátil, com alto potencial para novos confrontos regionais e impacto direto na estabilidade do Oriente Médio.

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