BRICS reagem a tarifas dos EUA: Lula propõe resposta conjunta e reposiciona o bloco no cenário global

Foto oficial da Cúpula dos BRICS Brasil 2025, mostrando líderes e representantes dos países membros, convidados e organizações internacionais, reunidos em pose oficial e de mãos dadas, com o cenário do pôr do sol e a logo “BRICS Brasil 2025” ao fundo.
Líderes dos países membros e convidados da Cúpula dos BRICS Brasil 2025 unidos no segundo dia de trabalho, debatendo temas centrais da agenda internacional, como Meio Ambiente, COP30 e Saúde Global./ ricardostuckert

A escalada na disputa comercial entre Estados Unidos e economias emergentes chegou a um novo patamar em 6 de agosto de 2025, quando entrou em vigor a tarifa de 50% sobre produtos brasileiros anunciada pela administração Trump — após um primeiro aumento de 10% em abril deste ano. Em resposta, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva anunciou que fará contato direto com os líderes dos demais países do BRICS — Índia, China, Rússia e África do Sul — para articular uma estratégia multilateral de reação às barreiras tarifárias norte-americanas. O movimento reafirma a vocação do bloco por uma cooperação Sul-Sul e marca o Brasil como protagonista da defesa dos interesses dos emergentes no comércio global.

A articulação de Lula e o papel dos BRICS

Desde 2023, com o anúncio da adesão de novos países como Egito, Irã, Emirados Árabes Unidos, Etiópia e Argentina, alguns analistas e veículos internacionais passaram a se referir ao grupo como BRICS+. Apesar disso, a sigla original ainda é amplamente usada em documentos oficiais e na imprensa. Essa ampliação reflete o crescente papel do bloco como uma alternativa estratégica às alianças ocidentais.

Em entrevista coletiva à Reuters, Lula afirmou que não buscará diálogo direto imediato com Trump, considerando-o pouco produtivo neste momento, mas fará contato inicialmente com Narendra Modi (Índia) e Xi Jinping (China), aproveitando a presença de Modi no próximo encontro da Organização de Cooperação de Xangai (OCX) em agosto. O objetivo é fechar um posicionamento conjunto dos BRICS antes de qualquer negociação bilateral com Washington.

Líder histórico na fundação do grupo, Lula defende:

  • Tarifas retaliatórias coordenadas: análise de alvos americanos sensíveis a partir de setores nacionais.
  • Expansão do uso de moedas locais: reduzir a dependência do dólar em transações intra-BRICS.
  • Ação junto à OMC: reclamação formal contra práticas abusivas dos EUA. O trâmite pode levar meses, mas serve como mecanismo de pressão multilateral e fortalece o posicionamento jurídico internacional do bloco.
  • Fundo de estabilidade: mecanismo para compensar perdas na exportação de produtos essenciais, com financiamento potencial via Novo Banco de Desenvolvimento (NDB).

O NDB, criado em 2014 como uma alternativa às instituições financeiras tradicionais lideradas pelo Ocidente, ganha relevância neste contexto ao oferecer crédito em moedas locais e financiamento para infraestrutura logística e adaptação comercial dos países membros.

Reação dos demais membros e repercussão internacional

  • Índia: enfrenta tarifa de até 50% em US$ 87 bilhões de exportações, principalmente têxteis e farmacêuticos. Analistas avaliam que Nova Délhi poderá oferecer concessões seletivas em produtos agrícolas americanos para buscar uma saída negociada. A medida também gerou forte repercussão na mídia internacional. EUA impõem tarifas de 50% sobre produtos indianos: escalada nas tensões comerciais
  • China: exportadora de semicondutores e bens industriais, já sinalizou preocupação com a escalada protecionista e defende respostas multissetoriais.
  • Rússia: pressionada em recursos minerais, mantém diálogo com parceiros sobre diversificação de mercados e fortalecimento do Novo Banco de Desenvolvimento.
  • África do Sul: busca equilibrar protestos internos à medida que exportações agrícolas e de minerais podem sofrer forte impacto.

Nos Estados Unidos, setores empresariais e agrícolas demonstraram preocupação com as tarifas impostas por Trump. A National Foreign Trade Council (NFTC) e a American Farm Bureau Federation divulgaram notas contrárias às medidas, alertando para o risco de retaliações que poderiam prejudicar exportadores de soja, milho, carne bovina e equipamentos industriais. Alguns senadores democratas e republicanos moderados pressionam por revisão das tarifas, alegando impacto negativo na competitividade americana.

Especialistas divergem: para alguns, a resposta conjunta elevará o poder de barganha dos emergentes; para outros, correrá o risco de agravar sanções americanas e gerar instabilidade econômica em países vulneráveis. O economista indiano Rajiv Menon, por exemplo, defende a criação de um órgão permanente de defesa comercial no âmbito do BRICS.

O papel do 17º Summit do BRICS

No encontro de líderes em Rio de Janeiro, realizado em 6 de julho de 2025, poucas semanas antes das tarifas entrarem em vigor, o bloco já havia adotado a Declaração do Rio, focada em governança de IA e cooperação financeira. Nessa ocasião, foi confirmada a presidência rotativa da Índia em 2026 e traçadas diretrizes para reforço institucional do bloco.

Considerações finais

A ofensiva tarifária americana sob o comando de Donald Trump constitui um divisor de águas para os BRICS. A iniciativa de Lula de buscar consenso interno antes de negociar com Washington pode não apenas mitigar os efeitos imediatos das tarifas, mas também projetar o bloco como ator decisivo na promoção de um comércio global mais equilibrado e multipolar. O desfecho dependerá da habilidade diplomática dos líderes em manter a coesão frente às pressões econômicas e políticas externas.

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