Crescimento fraco do PIB expõe limites do modelo econômico da Tailândia e reacende debate por reformas profundas

Vista aérea de Bangkok com o Parque Lumphini em primeiro plano, fotografada a partir do hotel Dusit Thani.
Vista aérea de Bangkok com o Parque Lumphini em destaque, fotografada a partir do hotel Dusit Thani, na capital tailandesa. A imagem mostra a combinação de áreas verdes e grandes edifícios no centro financeiro de Bangkok.

A economia da Tailândia entra em 2025 sob um clima de frustração e preocupação. Após anos de recuperação lenta pós-pandemia, o crescimento projetado para o próximo ano gira em torno de 1,8% a 2,3%, com muitas estimativas convergindo para algo próximo de 2% – bem abaixo de outros países do Sudeste Asiático, como Vietnã, Filipinas ou Indonésia.

Os números mais recentes confirmam a perda de fôlego: o PIB cresceu apenas 1,2% no terceiro trimestre de 2025 em relação ao ano anterior, com queda de 0,6% na comparação trimestral, a pior contração desde 2021.

Esse cenário reacendeu em Bangkok um debate que vinha sendo empurrado com a barriga: até que ponto a Tailândia pode continuar apoiada em turismo, exportações tradicionais e estímulos pontuais, sem enfrentar reformas estruturais em competitividade, produtividade e demografia?

Um crescimento sistematicamente abaixo dos vizinhos

A Tailândia, segunda maior economia do Sudeste Asiático, tem crescido de forma cronicamente mais lenta que seus pares regionais há pelo menos uma década. Mesmo em 2023 e 2024, quando muitos países da região registraram expansão robusta pós-Covid, Bangkok ficou para trás.

Alguns elementos ajudam a entender o porquê:

  • Exportações fracas: a indústria tailandesa enfrenta concorrência crescente, especialmente de Vietnã e Indonésia, em setores como eletrônicos, automotivo e têxtil;
  • Turismo abaixo do potencial: as chegadas de turistas chineses ainda não voltaram plenamente aos níveis pré-pandemia, prejudicando hotéis, comércio e serviços;
  • Consumo doméstico frágil: famílias estão muito endividadas, o que limita o espaço para o consumo puxar o PIB;
  • Incerteza política recorrente: mudanças de governo, suspensão de líderes e disputas judiciais trazem um ruído permanente, afetando a confiança de investidores.

O resultado é um país preso em um “meio do caminho”: não é mais uma economia de custos muito baixos, mas ainda não conseguiu subir plenamente para a liga de inovação e alta tecnologia.

Projeções modestas: quando 2% vira “otimismo”

Em 2025, organismos internacionais e analistas privados começaram a revisar para baixo suas projeções para a Tailândia:

  • o Banco Mundial cortou a estimativa de crescimento para 2025 para cerca de 1,8%, citando fraqueza nas exportações, no turismo e na demanda interna;
  • associações empresariais locais falam em intervalo de 1,8% a 2,2%, alertando para impactos de um baht forte, competição de preço nas exportações e perda de dinamismo industrial.

Numa região em que crescer 4% ou 5% ainda é comum, um PIB de 2% passa a ser interpretado menos como “estabilidade” e mais como sinal de estagnação estrutural.

Respostas do governo: estímulos, carteira digital e orçamento expansionista

O governo tem recorrido a uma combinação de estímulos fiscais e programas de incentivo ao consumo para tentar “chacoalhar” a economia.

Entre as principais iniciativas:

  • Esquemas de co-pagamento e transferência
    Programas como o Khon La Khrueng Plus e, anteriormente, o “digital wallet scheme”, que transfere 10.000 baht em crédito digital para milhões de cidadãos, foram desenhados para impulsionar o consumo e destravar o comércio local.
  • Orçamento expansionista, mas com limite
    O plano fiscal para 2027 prevê gastos de cerca de 3,788 trilhões de baht, com déficit em torno de 788 bilhões, baseado numa projeção de crescimento entre 2,1% e 3,1%. Ao mesmo tempo, o governo promete restaurar a “estabilidade fiscal” e manter a dívida pública por volta de 69% do PIB, próxima ao teto informal de 70%.
  • Projetos controversos de estímulo ao turismo
    Iniciativas como a proposta de legalizar cassinos em grandes complexos de entretenimento foram apresentadas como solução para dinamizar turismo, atração de investimentos e arrecadação, mas encontraram forte resistência de grupos religiosos e sociais, além de incerteza política após a suspensão da então primeira-ministra Paetongtarn Shinawatra.

Na prática, o governo alterna entre medidas de curto prazo — para evitar que a economia esfrie de vez — e um discurso de responsabilidade fiscal para acalmar mercados e agências de rating.

O diagnóstico dos economistas: problema é estrutural, não apenas conjuntural

Economistas locais e internacionais convergem em um ponto: o problema da Tailândia não é apenas um “ciclo ruim”.

Algumas fragilidades estruturais se destacam:

  1. Demografia envelhecendo rapidamente
    • A Tailândia está envelhecendo antes de se tornar rica, com queda na taxa de natalidade e rápido aumento da proporção de idosos;
    • isso pressiona o sistema de previdência, reduz a força de trabalho e aumenta custos sociais.
  2. Produtividade estagnada
    • A transição de uma economia baseada em manufatura de baixo custo para uma de inovação e serviços avançados não avançou com a velocidade necessária;
    • investimentos em P&D, educação de qualidade e capacitação tecnológica ficam atrás de alguns vizinhos e competidores.
  3. Dependência de setores vulneráveis
    • turismo e exportações de manufaturados padronizados são altamente sensíveis a choques externos, flutuações cambiais e mudanças de política comercial global;
    • choques como a pandemia, guerras regionais, desaceleração da China e mudanças em cadeias globais de valor atingem a Tailândia de forma desproporcional.
  4. Incerteza política crônica
    • golpes, dissoluções de partidos, suspensões de líderes e mudanças frequentes de governo criam uma camada de instabilidade que pesa nas decisões de investimento de longo prazo.

Debate interno: que reformas a Tailândia precisa?

Os números fracos de PIB revitalizaram propostas de reformas mais profundas. Entre as principais agendas discutidas por economistas, empresários e alguns setores políticos:

1. Reformas de competitividade e clima de negócios

  • simplificação regulatória, redução de burocracia e combate a entraves que dificultam abertura, expansão e fechamento de empresas;
  • aprimoramento do sistema tributário para atrair mais investimento estrangeiro e incentivar inovação;
  • melhoria de infraestrutura logística para reduzir custos de transporte e integrar melhor o país a cadeias globais.

2. Educação, inovação e indústria 4.0

  • investimento pesado em educação técnica e superior, com foco em tecnologia, engenharia e competências digitais;
  • fortalecimento de parques tecnológicos, incubadoras e hubs de inovação;
  • apoio a setores de maior valor agregado, como biotecnologia, semicondutores, energias renováveis e economia criativa.

3. Reforma do turismo

  • reposicionar o turismo tailandês, indo além da lógica de volume e baixo custo, para atrair visitantes de maior gasto;
  • diversificar destinos, melhorar infraestrutura e reforçar padrões de segurança, sustentabilidade e qualidade de serviços.

4. Governança e estabilidade política

  • previsibilidade institucional é vista como um ativo crucial para destravar investimentos de longo prazo;
  • uma agenda mínima de consensos econômicos, preservada mesmo com alternância de governos, poderia reduzir a percepção de risco.

Risco de “década perdida” ou oportunidade de reinvenção?

Com crescimento em torno de 2% e sinais de fadiga do modelo atual, parte da academia e do setor privado fala em risco de uma “década perdida” tailandesa, marcada por:

  • crescimento baixo,
  • produtividade estagnada,
  • envelhecimento populacional acelerado,
  • e desigualdades persistentes entre Bangkok, polos turísticos e o interior menos desenvolvido.

Por outro lado, há quem veja a conjuntura como janela de oportunidade:

  • a pressão por resultados pode obrigar o sistema político a sair da lógica de remendos e partir para reformas mais ambiciosas;
  • o reposicionamento de cadeias globais de produção, com empresas buscando reduzir exposição à China, abre espaço para países que conseguirem se vender como destinos confiáveis de investimento — e a Tailândia ainda tem uma base industrial relevante, boa infraestrutura e posição geográfica estratégica no Sudeste Asiático.

Conclusão: 2% de crescimento e um grande debate sobre o futuro

O dado aparentemente seco — PIB da Tailândia crescendo apenas cerca de 2% em 2025 — funciona como um termômetro de algo maior: a dificuldade do país em encontrar um novo motor de desenvolvimento sustentável, inclusivo e competitivo.

Entre estímulos de curto prazo, programas de carteira digital e tentativas de reativar o turismo, o governo tenta ganhar tempo. Mas o debate econômico em Bangkok já deixou claro que, sem reformas estruturais em produtividade, demografia, clima de negócios e estabilidade política, a Tailândia corre o risco de ficar presa ao rótulo de economia “mediana”, sempre aquém de seu potencial.

Nos próximos anos, o ritmo de implementação (ou frustração) dessas reformas vai dizer se os 2% de hoje serão apenas um episódio de transição ou o retrato permanente de uma economia que perdeu o passo em relação aos vizinhos.

Seja o primeiro a comentar

Faça um comentário

Seu e-mail não será publicado.


*