Instabilidade Política no Leste Europeu Aumenta Pressão sobre a União Europeia

Andrej Babiš sentado à mesa com representantes da Polônia e da Hungria durante reunião entre líderes da Europa Central, em 29 de maio de 2025.
O bilionário e primeiro-ministro tcheco Andrej Babiš participa de reunião com representantes da Polônia e da Hungria, afirmando em tom descontraído: “Estamos esperando pelo Pelle 😂 🇨🇿🤝🇵🇱🇭🇺🇸🇰”, em referência ao presidente eslovaco Peter Pellegrini.

A ascensão de partidos populistas e eurocéticos em países como Hungria, Eslováquia e República Tcheca ameaça a coesão política do bloco e coloca em xeque o apoio europeu à Ucrânia

A União Europeia, formada por 27 países, vive um momento de tensão interna com o avanço de governos que desafiam os valores democráticos do bloco. À medida que partidos populistas e nacionalistas ganham força, cresce o risco de fragmentação institucional, afrouxamento das normas comuns e dificuldade em manter políticas conjuntas de segurança, direitos humanos e solidariedade entre os membros.

Essa onda política, que atinge especialmente o Leste Europeu, ameaça enfraquecer a unidade da Europa em um momento de incerteza geopolítica — com a guerra na Ucrânia, o aumento das tensões com a Rússia e o fortalecimento de movimentos eurocéticos dentro do continente.

Hungria: o epicentro do populismo europeu

O primeiro-ministro Viktor Orbán continua sendo o rosto mais proeminente do populismo no Leste Europeu. No poder desde 2010, Orbán consolidou um modelo de governo que desafia diretamente os valores centrais da União Europeia, especialmente no que diz respeito à liberdade de imprensa, independência judicial e direitos civis.

Nas últimas semanas, Budapeste intensificou sua oposição a novas sanções contra Moscou, alegando que essas medidas “prejudicam mais os europeus do que os russos”. Orbán também vem travando uma batalha diplomática dentro do Conselho Europeu, bloqueando pacotes de ajuda financeira à Ucrânia e exigindo “uma reavaliação completa” da política europeia sobre o conflito.

A Hungria, isolada em várias frentes, ainda encontra aliados pontuais em outros governos da região, formando uma espécie de “eixo de resistência” dentro da UE.

Eslováquia: o retorno do pragmatismo pró-Rússia

A vitória eleitoral de Robert Fico, em 2023, marcou o retorno de uma política externa ambígua em Bratislava. Fico, conhecido por sua postura crítica às sanções contra Moscou e por declarações que relativizam a invasão da Ucrânia, consolidou uma posição de equilíbrio entre o Ocidente e a Rússia.

Desde que assumiu novamente o cargo de primeiro-ministro, Fico tem reduzido o envolvimento eslovaco no apoio militar à Ucrânia e reforçado a necessidade de “priorizar os interesses nacionais sobre as pressões externas”. Sua coalizão de governo, que reúne partidos de orientação nacionalista e conservadora, ecoa a retórica húngara de “soberania frente a Bruxelas”.

República Tcheca: tensões políticas internas e crescimento populista

Embora o governo tcheco permaneça oficialmente alinhado à política externa da UE, as tensões internas têm aumentado. O ex-primeiro-ministro Andrej Babiš, líder do movimento ANO, de tendência populista, tem recuperado apoio nas pesquisas eleitorais, impulsionado por críticas à “burocracia de Bruxelas” e ao aumento dos custos de energia — frequentemente atribuídos às sanções contra a Rússia.

A oposição populista tcheca também tem capitalizado o descontentamento social com a inflação e o custo de vida, fenômenos que afetam toda a região. Isso cria terreno fértil para um discurso que combina nacionalismo econômico, ceticismo em relação à União Europeia e desconfiança das elites políticas ocidentais.

Impactos econômicos da instabilidade política

Essa instabilidade política tem consequências diretas além do terreno diplomático — ela ameaça o valor do euro, perturba cadeias de comércio e reduz a confiança de investidores estrangeiros.

Um relatório do Vienna Institute for International Economic Studies (wiiw) apontou que o investimento estrangeiro direto (IED) na Europa Oriental e nos Bálcãs caiu cerca de 44% nos primeiros três trimestres de 2024 em comparação com o mesmo período do ano anterior. O estudo atribui parte dessa queda à incerteza política e às tensões regionais.

Além disso, o Banco Central Europeu (BCE) alerta que a geofragmentação econômica — especialmente a reconfiguração dos fluxos de comércio e investimento ao longo de linhas geopolíticas — pode reduzir o PIB da zona do euro em mais de 2% e elevar a inflação em cerca de 4%, caso o cenário de instabilidade se agrave.

Segundo o think tank Vienna Institute for International Economic Studies, “os investidores estão recuando em face da incerteza política e das tensões geopolíticas, com quedas acentuadas nos novos projetos na Europa Oriental”.

Impactos na coesão da União Europeia

A ascensão desses movimentos não é apenas um fenômeno doméstico: ela tem consequências diretas sobre o funcionamento e a coesão da União Europeia. Decisões cruciais — como a aprovação de orçamentos, o envio de ajuda militar à Ucrânia e as reformas institucionais — exigem unanimidade entre os membros do bloco.

Com governos dispostos a vetar resoluções que considerem “contrárias aos seus interesses nacionais”, a UE se vê cada vez mais dependente de negociações complexas e concessões políticas. Essa fragmentação interna ameaça enfraquecer a posição europeia frente a potências externas como Rússia, China e Estados Unidos.

Bruxelas em alerta

A Comissão Europeia tem reagido com cautela. Em setembro, a presidente Ursula von der Leyen destacou que “a desinformação e as campanhas híbridas vindas de fora da Europa estão explorando divisões internas para minar nossa unidade”.

Além disso, o bloco vem estudando mecanismos de condicionalidade para fundos europeus — um instrumento que permite suspender recursos de países que violem princípios democráticos ou bloqueiem decisões essenciais da União. A Hungria já foi alvo de congelamento parcial de fundos, medida que gerou atritos diplomáticos intensos.

O dilema europeu: soberania nacional vs. solidariedade continental

O avanço do populismo no Leste reacende um dilema histórico da União Europeia: como equilibrar a soberania dos Estados-membros com a necessidade de solidariedade e ação coletiva.

Especialistas apontam que a integração europeia, nascida do desejo de evitar novos conflitos no continente, está sendo testada por forças políticas que defendem uma Europa “de nações soberanas”, em contraste com o ideal de uma Europa “unida e coesa”.

Se o movimento populista continuar a crescer, a UE poderá enfrentar não apenas bloqueios políticos, mas uma erosão gradual da confiança mútua, comprometendo sua capacidade de agir de forma unificada diante de crises globais.

Conclusão

O Leste Europeu se tornou o palco mais recente de um embate ideológico dentro da União Europeia. Entre a defesa da soberania nacional e a necessidade de manter uma frente comum, o bloco caminha sobre uma linha tênue.

Com a guerra na Ucrânia em curso, o aumento da influência russa e a intensificação das campanhas de desinformação, a instabilidade política na região representa mais do que um desafio interno — é uma ameaça estratégica à coesão e à credibilidade da Europa no cenário global.

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