Divisões Internas e Escalada Militar: Israel Intensifica Pressão sobre Gaza em Meio a Crescente Dissenso Político

Duas crianças palestinas sentadas entre escombros de edifícios destruídos em Gaza, cercadas por destroços e paredes danificadas.
Duas crianças palestinas descansam entre os escombros de prédios destruídos na Faixa de Gaza, símbolo da crise humanitária e das consequências do conflito atual./ Mohammed Ibrahim

A mais recente ordem das Forças de Defesa de Israel (IDF) para a evacuação de civis do bairro de Zeitoun (grafia oficial adotada pela ONU e IDF), em Gaza City, em direção à área costeira de Al Mawasi expõe não apenas o endurecimento da ofensiva, mas também fissuras no comando militar e tensões no governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu.

Evacuação em massa e crise humanitária agravada

Na manhã de 6 de agosto, a IDF emitiu alertas para moradores de nove setores do bairro de Zeitoun saírem imediatamente, deslocando-se para Al Mawasi, a sudoeste de Khan Younis, área já saturada por deslocados.

A escolha de Al Mawasi como zona de evacuação baseia-se na percepção israelense de que a área, por ser próxima à costa e menos urbanizada, oferece menos risco militar. No entanto, essa leitura ignora o colapso logístico da região, que já sofre com falta de água potável, alimentos e abrigos dignos, segundo relatos de Agências da ONU e ONGs.

Um relatório quinzenal da OCHA (Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários) aponta que “limiares de fome foram atingidos em grande parte de Gaza” e que quase 1,9 milhão de pessoas estão internamente deslocadas, sem perspectiva de retorno próximo.

Além disso, um levantamento da AP News revelou que, até agosto, 193 pessoas morreram de malnutrição, incluindo 96 crianças, enquanto apenas 1,5% das terras agrícolas de Gaza permanece cultivável.

Divergência entre comando militar e liderança política

Segundo relatos da Reuters, o Chefe do Estado-Maior, general Eyal Zamir, manifestou em reunião com Netanyahu sua oposição à ampliação da ocupação de Gaza, advertindo que uma investida total poderia tornar as forças israelenses “mais vulneráveis e dificultar a libertação dos reféns” ainda mantidos pelo Hamas.

Fontes próximas ao gabinete militar indicam que Zamir alertou também para o “risco de aprisionamento da própria tropa em território densamente povoado”, posição respaldada por ex-altos oficiais de segurança.

Declarações de Israel Katz e o fortalecimento do controle civil

Em resposta às críticas, o ministro da Defesa, Israel Katz, declarou:

“O Exército de Defesa de Israel deve executar as decisões do governo com profissionalismo e disciplina. A subordinação civil é pilar de nossa democracia e de nossa segurança.”

A fala reforça que, mesmo havendo discordância, as Forças Armadas estão vinculadas à cadeia de comando civil, conforme prevê a Lei Básica israelense.

Contexto político e pressões externas

Internamente, Netanyahu sofre forte desgaste: pesquisas indicam queda de popularidade e protestos pedem sua renúncia sob o lema “Nem guerra, nem corrupção”. No plano internacional, EUA e UE pressionam por um cessar-fogo imediato, em meio a denúncias de que a fome está sendo usada como arma de guerra. Declarações do enviado americano Steve Witkoff, minimizando a fome em Gaza, geraram reação imediata e forçaram Washington a ajustar sua retórica.

Análise: impasse estratégico e riscos futuros

  1. Objetivos militares indefinidos: O prolongamento das operações sem metas claras ameaça esgotar reservistas e ampliar críticas domésticas e internacionais.
  2. Risco jurídico: Acusações de crimes de guerra por deslocamentos forçados e bloqueio humanitário podem implicar oficiais israelenses e políticos.
  3. Desgaste político-militar: O descompasso entre governo e Exército eleva a chance de crise institucional, com potencial de prejudicar a coesão nacional.

Para o coronel reformado Amos Gilad, “a vitória militar só será sustentável se vier acompanhada de uma solução política que garanta segurança a Israel e direitos mínimos aos palestinos”.

O que vem a seguir

Com o Exército dividido, o governo pressionado e a comunidade internacional cobrando medidas urgentes, a ofensiva em Gaza pode sofrer reviravoltas nas próximas semanas. Novas deliberações no gabinete de segurança — possivelmente lideradas por Katz — definirão se Israel mantém o curso rumo à ocupação total ou se recua para viabilizar um cessar-fogo. Enquanto isso, milhares de civis continuam à beira da fome, em condições que muitos observadores descrevem como o “pior colapso humanitário do século”.

Conclusão

A ofensiva israelense em Gaza, marcada pela ordem de evacuação do bairro de Zeitoun para a superlotada região de Al Mawasi, revela um cenário complexo de tensões internas e externas. Enquanto o governo de Netanyahu mantém uma postura rígida e centralizadora, o alto comando militar demonstra reservas estratégicas significativas, refletindo a dificuldade de conciliar objetivos políticos e militares.

O agravamento da crise humanitária e as pressões internacionais aumentam o desafio de encontrar uma saída que evite um colapso total na Faixa de Gaza e preserve a estabilidade regional. Diante desse impasse, o futuro da ofensiva — e das vidas de milhões de civis — dependerá do equilíbrio delicado entre decisões políticas, limitações militares e o clamor humanitário que cresce a cada dia.

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