A nova visita do presidente francês Emmanuel Macron à China, programada para esta semana, revela uma estratégia europeia marcada por tensões internas: ao mesmo tempo em que o continente tenta fortalecer sua competitividade e autonomia estratégica, ainda depende fortemente do mercado e da capacidade industrial chinesa. A viagem ocorre em um momento de crescente rivalidade geopolítica entre Ocidente e Pequim, e pressões internas na União Europeia (UE) para reduzir vulnerabilidades em setores considerados críticos.
Europa entre dois polos: dependência econômica e competição tecnológica
A relação entre Europa e China tornou-se uma espécie de “corda bamba estratégica”. Por um lado, a UE reconhece que a China é um parceiro comercial fundamental, responsável por parte crucial do fluxo de bens industriais, insumos tecnológicos e investimentos. Por outro, há crescente preocupação com a expansão global de empresas chinesas, com subsídios estatais agressivos e práticas consideradas desleais por alguns setores europeus.
Macron tenta se posicionar como um mediador entre a defesa de valores ocidentais e a necessidade de manter relações pragmáticas com Pequim. A França, que busca reforçar sua autonomia estratégica, vê na diplomacia econômica com a China uma forma de ampliar margens de negociação, tanto dentro da logística global quanto no cenário político internacional.
Pressões internas: indústria europeia enfraquecida e risco de desindustrialização
A visita acontece num contexto de crescente inquietação no setor industrial europeu. A transição energética, embora considerada urgente, trouxe efeitos colaterais inesperados. Um estudo recente aponta que a Europa possui capacidade de produção de veículos elétricos muito superior à atual demanda, revelando um desequilíbrio estrutural que afeta investimentos e competitividade.
Ao mesmo tempo, decisões políticas — como possíveis revisões no cronograma de eliminação dos motores a combustão — mostram como governos europeus enfrentam pressões simultâneas de ambientalistas, industriais e sindicatos. Essas tensões colocam a Europa em posição vulnerável diante de competidores externos, especialmente a China, que domina cadeias de suprimentos essenciais em energia limpa e tecnologia de ponta.
Autonomia estratégica: um ideal ainda distante
O conceito de “autonomia estratégica europeia”, defendido por Macron, pretende reduzir a dependência europeia não apenas da China, mas também dos Estados Unidos. O objetivo é que a UE tenha mais margem de manobra para tomar decisões soberanas nas áreas de energia, defesa, indústria e tecnologia.
Mas, na prática, a autonomia ainda é limitada. A demora em consolidar cadeias produtivas próprias, somada às divergências entre os Estados-membros sobre quão distante o bloco deve se posicionar de Pequim, dificulta a construção de uma estratégia comum. Para países como Alemanha, fortemente dependentes de exportações industriais ao mercado chinês, a postura de Macron parece arriscada. Já para governos mais preocupados com segurança e soberania tecnológica, o presidente francês sinaliza liderança necessária.
Diplomacia econômica em tempos de incerteza geopolítica
A viagem de Macron ocorre enquanto a Europa enfrenta desafios externos simultâneos: a guerra na Ucrânia, as tensões comerciais com os Estados Unidos e a pressão global do setor tecnológico. Nesse cenário, Macron busca reforçar acordos comerciais e abrir espaço para investimentos que possam fortalecer a indústria francesa e europeia.
Embora não deva resultar em mudanças imediatas, a visita envia uma mensagem clara: a Europa pretende manter diálogo ativo com Pequim, mesmo em meio às disputas geopolíticas — e quer fazê-lo em seus próprios termos. Isso significa cooperação econômica seletiva, vigilância estratégica e tentativas de reduzir vulnerabilidades em setores-chave como semicondutores, mineração crítica e energia renovável.
Conclusão: uma Europa dividida, mas consciente dos riscos
A nova iniciativa diplomática de Emmanuel Macron ilustra o momento delicado vivido pela Europa. Dividida entre suas necessidades econômicas e preocupações geopolíticas, a UE tenta se reposicionar diante de um mundo cada vez mais polarizado.
Macron aposta na ideia de que a Europa pode dialogar com a China sem se submeter, mas também sem fechar portas. Resta saber se os demais Estados-membros estarão dispostos a seguir esse caminho — ou se preferirão estratégias mais alinhadas a Washington ou mais desconfiadas de Pequim.
O fato é que, mesmo com tensões crescentes, a China continuará sendo peça central na equação econômica europeia. E a habilidade de equilibrar influência, competição e cooperação pode definir o lugar da Europa na nova ordem internacional.

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