Após vitória pró-europeia, o país acelera reformas e busca reduzir dependência da Rússia enquanto enfrenta desafios regionais e internos
A Moldávia vive um dos momentos mais decisivos da sua história recente. Após as eleições parlamentares de 2025, o Partido da Ação e Solidariedade (PAS), de orientação pró-europeia e liderado pela presidente Maia Sandu, conquistou maioria no Parlamento, consolidando o compromisso do país com o projeto de integração à União Europeia (UE).
O resultado eleitoral fortaleceu politicamente o governo e abriu espaço para uma série de reformas institucionais, econômicas e energéticas que visam aproximar o país dos padrões europeus. No entanto, o caminho moldavo rumo à adesão plena à UE continua repleto de desafios — desde a dependência energética da Rússia até divisões internas e tensões regionais, especialmente na região separatista da Transnístria.
Avanço político e consolidação pró-europeia
As eleições parlamentares de setembro de 2025 representaram um marco para o futuro europeu da Moldávia. O PAS garantiu maioria absoluta, enquanto partidos ligados ao eixo pró-Rússia sofreram forte derrota. Essa mudança consolidou uma guinada estratégica em direção à Europa e reduziu temporariamente a influência política de Moscou em Chisinau.
Segundo Ion Chirilă, analista político ouvido pelo Hoje no Mundo Político, “essa vitória representa um voto de confiança na visão europeísta de Maia Sandu. É uma chance histórica de romper com décadas de oscilação entre o Leste e o Oeste e consolidar a Moldávia como parte do espaço democrático europeu”.
O governo já anunciou que pretende acelerar o processo de adesão e alinhar as legislações nacionais ao acquis communautaire(legislação comunitária europeia), o conjunto de normas que define o funcionamento da União Europeia. Para isso, reformas no Judiciário, combate à corrupção, estabilidade macroeconômica e fortalecimento institucional estão no topo da agenda.
Dependência energética e vulnerabilidade geopolítica
Um dos maiores entraves ao avanço europeu da Moldávia é sua dependência energética da Rússia. Historicamente, o país importou a maior parte do seu gás e eletricidade de fornecedores controlados por Moscou ou localizados na Transnístria, região separatista pró-Rússia onde ainda há presença militar russa.
Essa dependência vem sendo usada como instrumento de pressão política. Nos últimos anos, cortes de gás e elevação de preços serviram como mecanismos de coerção contra governos moldavos com posições ocidentais.
De acordo com a Reuters, a presidente Maia Sandu e sua equipe vêm priorizando a diversificação energética. A Moldávia busca integração plena ao mercado europeu de eletricidade (ENTSO-E), firmou acordos de interconexão com a Romênia e a Ucrânia, e investe em energia renovável e eficiência energética.
A UE, por sua vez, firmou com Chisinau um Plano Conjunto de Segurança Energética, prevendo investimentos em modernização de redes, construção de novas interligações e fundos de apoio a consumidores vulneráveis. Essa parceria visa reduzir a influência russa sobre o setor energético e fortalecer a resiliência moldava em crises futuras.
Reformas judiciais, combate à corrupção e modernização institucional
Outro pilar essencial da integração europeia é a reforma do sistema de justiça. A UE exige avanços concretos no combate à corrupção, na independência do Judiciário e na eficiência da administração pública.
Desde 2024, a Moldávia vem implementando um amplo programa de reforma judicial, com apoio técnico da Comissão Europeia e do Banco Europeu de Reconstrução e Desenvolvimento (BERD). As mudanças incluem concursos públicos para juízes, transparência na escolha de procuradores e digitalização de processos.
A presidente Sandu afirmou recentemente que “a integração europeia da Moldávia não é apenas uma meta política, mas uma transformação profunda do Estado. Significa garantir justiça, transparência e oportunidades reais para nossos cidadãos”.
Analistas ouvidos pelo Hoje no Mundo Político avaliam que os avanços são significativos, embora lentos. “Há resistência dentro das instituições, especialmente entre elites políticas acostumadas a um modelo antigo de poder”, explica o especialista romeno Mihai Popescu. “Mas o alinhamento com a UE já é irreversível.”
Desafios econômicos e sociais
Mesmo com apoio europeu, a Moldávia continua sendo um dos países mais pobres da Europa. Cerca de 30% da população vive fora do país, e o envio de remessas por emigrantes é vital para a economia local. O governo enfrenta o desafio de equilibrar as reformas exigidas pela UE com políticas sociais que protejam os mais vulneráveis.
As reformas energéticas e fiscais, por exemplo, podem elevar o custo de vida no curto prazo. Para evitar tensões sociais, o governo criou subsídios temporários e programas de compensação para famílias de baixa renda.
Outro obstáculo é a fragmentação política interna. Regiões como Gagauzia — de maioria russofônica e culturalmente próxima de Moscou — continuam resistindo à política pró-europeia de Chisinau. A manutenção da coesão nacional exigirá diálogo e medidas de inclusão, especialmente diante da influência russa e da questão não resolvida de Transnístria.
Apoio da União Europeia e metas de adesão
A UE tem reforçado seu compromisso com a integração moldava. Em fevereiro de 2025, o Conselho Europeu aprovou um pacote de quase 2 bilhões de euros para apoiar reformas institucionais, projetos de infraestrutura, transição energética e fortalecimento do Estado de Direito.
Com esses recursos e a estabilidade política conquistada nas urnas, o governo moldavo estabeleceu uma meta ambiciosa: concluir as negociações de adesão até 2029 e obter a plena integração ao bloco até 2030.
De acordo com a Modern Diplomacy, a UE reconhece a Moldávia como um parceiro estratégico, especialmente devido à sua posição geográfica entre a Romênia (Estado-membro) e a Ucrânia. A estabilidade moldava é vista em Bruxelas como um elemento-chave para a segurança de toda a região do Leste Europeu.
Implicações regionais e geopolíticas
O avanço da Moldávia em direção à UE tem implicações diretas para o equilíbrio de poder entre Bruxelas e Moscou. Para a Rússia, a aproximação moldava representa mais uma perda de influência em sua antiga esfera pós-soviética, após a reorientação da Ucrânia e da Geórgia.
A UE, por outro lado, vê o caso moldavo como um teste para sua política de ampliação. O sucesso do país poderia servir de modelo para outras nações que buscam integração, mostrando que, mesmo com recursos limitados, a convergência europeia é possível com reformas consistentes e apoio internacional.
Segundo o analista Mihai Popescu, “a Moldávia tornou-se um laboratório da política europeia de expansão. Se conseguir consolidar sua democracia e resistir às pressões externas, abrirá um novo capítulo na relação entre o Leste Europeu e a União Europeia”.
Riscos e perspectivas futuras
Apesar do otimismo, há riscos significativos:
- Reversão política: o retorno de forças pró-Rússia poderia atrasar ou até interromper o processo de adesão;
- Instabilidade social: reformas econômicas podem gerar insatisfação popular;
- Dependência financeira: o país ainda depende fortemente de fundos e empréstimos externos;
- Questão territorial: a situação de Transnístria permanece um impasse que poderá afetar o ritmo das negociações.
Mesmo assim, diplomatas europeus consideram que a Moldávia caminha de forma mais firme do que em qualquer momento desde sua independência. A consolidação democrática e o avanço das reformas estruturais já colocam o país em uma trajetória inédita de modernização.
Conclusão
A Moldávia está diante de uma encruzilhada histórica. O país tem agora estabilidade política, apoio europeu e vontade reformista — uma combinação rara em sua história recente. A adesão à União Europeia, embora ainda distante, deixou de ser um sonho para se tornar um projeto concreto.
Como resume Ion Chirilă, “a integração europeia da Moldávia não será apenas uma mudança de política externa. Será uma reconstrução nacional, uma redefinição do que significa ser um Estado moderno no coração do Leste Europeu”.
Se conseguir sustentar esse ritmo e resistir às pressões internas e externas, a Moldávia poderá, dentro da próxima década, tornar-se não apenas membro da União Europeia, mas símbolo de que mesmo pequenas democracias podem trilhar seu próprio caminho de independência, estabilidade e prosperidade.

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