Síria e Israel avançam em conversações diretas após anos de hostilidade

Syria's interim president Ahmed al-Sharaa holds a joint press conference with the Turkish president following their meeting at the Presidential Palace in Ankara, on February 4, 2025. Syria's interim president is in Turkey for talks with the country's leader after flying in from Saudi Arabia, where he was seeking help from wealthy Gulf countries to finance the reconstruction of his war-ravaged nation and revive its economy, as part of his second international trip since ousting the former Syrian president. (Photo by OZAN KOSE / AFP) (Photo by OZAN KOSE/AFP via Getty Images)

O presidente sírio Ahmed al-Sharaa declarou que Damasco e Tel Aviv estão conduzindo negociações diretas com o objetivo de alcançar um entendimento político após décadas de hostilidade. A afirmação, feita em entrevista a meios locais e confirmada por assessores próximos ao governo, marca uma mudança significativa no cenário geopolítico do Oriente Médio e reacende o debate sobre o futuro das relações entre os dois países.

Um passo inédito após décadas de conflito

Desde a guerra de 1973, as relações entre Síria e Israel permaneceram congeladas, com breves tentativas de mediação ocorrendo nos anos 1990 sob patrocínio dos Estados Unidos. A Síria, membro histórico do chamado “Eixo de Resistência”, sempre manteve uma posição de confronto com o Estado israelense, especialmente em relação à ocupação das Colinas de Golã, território sírio ocupado por Israel desde 1967.

As declarações de al-Sharaa, ao mencionar que “já percorremos um bom caminho”, indicam que as negociações podem estar em estágio mais avançado do que o esperado, embora detalhes concretos sobre os temas em discussão ainda não tenham sido divulgados. Fontes diplomáticas regionais sugerem que segurança fronteiriça, acesso a recursos hídricos e questões territoriais são pontos centrais das conversas.

Contexto regional favorável à diplomacia

O anúncio ocorre em um momento de reconfiguração das alianças no Oriente Médio, impulsionado por iniciativas de normalização entre Israel e países árabes — um processo retomado com força após a retomada dos Acordos de Abraão sob o governo de Donald Trump.

Para a Síria, que busca reconstrução após mais de uma década de guerra civil, a abertura diplomática pode representar uma oportunidade estratégica de aliviar o isolamento internacional e atrair novos investimentos. Já para Israel, um eventual acordo com Damasco significaria reduzir a influência iraniana e do Hezbollah na fronteira norte, além de reforçar sua posição geopolítica em um momento de tensão com Gaza e Líbano.

O papel dos mediadores internacionais

Embora o presidente sírio tenha afirmado que as conversações são diretas, analistas apontam que mediadores discretos podem estar facilitando o processo. Fontes ligadas a diplomatas europeus mencionam a Rússia e os Emirados Árabes Unidos como possíveis intermediários, ambos com laços próximos ao governo sírio e interesse em estabilizar a região.

Moscou, em particular, tem buscado reafirmar seu papel como ator indispensável nas negociações do Oriente Médio, enquanto os Emirados mantêm política ativa de reconciliação regional e vêm apoiando a reintegração da Síria à Liga Árabe.

Possíveis obstáculos

Apesar do otimismo contido, especialistas alertam para os desafios históricos que cercam qualquer tentativa de paz entre os dois países. O principal entrave continua sendo a questão das Colinas de Golã, anexadas por Israel e reconhecidas pelos Estados Unidos durante o primeiro governo Trump como parte do território israelense — decisão rejeitada por Damasco e pela ONU.

Além disso, a presença de forças iranianas e milícias aliadas em território sírio é vista por Israel como ameaça direta à sua segurança. O sucesso das conversações dependerá, portanto, da capacidade de Damasco em equilibrar sua relação com Teerã e, ao mesmo tempo, garantir garantias de segurança aceitáveis para Tel Aviv.

Impactos regionais e globais

Um eventual acordo entre Síria e Israel teria efeitos profundos na geopolítica do Oriente Médio. Poderia abrir caminho para uma nova arquitetura de segurança regional, reduzir a margem de influência do Irã e até mesmo estimular negociações paralelas envolvendo o Líbano e outros atores.

Além disso, traria implicações diretas para a reconstrução síria, a retomada de fluxos econômicos e a estabilização de rotas comerciais que passam pelo Levante. A comunidade internacional — especialmente Estados Unidos, Rússia e União Europeia — observa atentamente os movimentos de Damasco, conscientes de que qualquer avanço diplomático nessa frente pode redefinir alianças e alterar o equilíbrio de poder no Oriente Médio.

Perspectivas

Ainda é cedo para prever se as conversações resultarão em um acordo formal. No entanto, o simples fato de Síria e Israel admitirem diálogo direto representa uma ruptura significativa com décadas de silêncio e conflito.

Caso as negociações avancem, elas poderão se tornar um dos eventos diplomáticos mais relevantes da década no Oriente Médio — comparável, em importância simbólica, aos acordos de paz entre Israel e Egito em 1979.

Por ora, o processo permanece envolto em sigilo, mas os sinais vindos de Damasco e Tel Aviv sugerem que uma nova fase de diplomacia regional pode estar em curso.

Conclusão

As negociações entre Síria e Israel representam um dos desenvolvimentos mais surpreendentes e potencialmente transformadores da política regional nas últimas décadas. Embora envoltas em sigilo e marcadas por desconfiança mútua, elas simbolizam uma tentativa de romper um ciclo de hostilidade que há muito molda o Oriente Médio.

Se concretizadas, essas conversações poderão inaugurar uma nova era de diálogo e pragmatismo diplomático, com impactos que vão além das fronteiras sírias e israelenses. No entanto, a trajetória até um eventual acordo será complexa e exigirá concessões difíceis de ambos os lados — em especial sobre o território ocupado do Golã e as alianças estratégicas da Síria.

Em um momento de transição global e de rearranjo de forças no Oriente Médio, a aproximação entre Damasco e Tel Aviv pode se tornar um ponto de inflexão histórico, redefinindo não apenas as relações bilaterais, mas também o equilíbrio geopolítico de toda a região.

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